(Fotos: Matheus Rodrigues /Aleam; Assessoria Carlinhos Bessa e Geraldo Magela /Agência Senado)
Manaus (AM) – Após perder Manaus e Humaitá, dois colégios eleitorais que por mais de uma década garantiram vitórias históricas ao PT, os partidos de esquerda iniciam uma ação para recuperar esses territórios. A iniciativa, no entanto, ocorre sem que a legenda apresente uma autocrítica consistente ou uma estratégia clara para enfrentar o bolsonarismo que se consolidou no estado desde 2018.
Na última terça-feira (25), dirigentes do PT, PV e PCdoB do Amazonas se reuniram com a direção nacional da Federação Brasil da Esperança, em Brasília, para discutir o cenário eleitoral e as estratégias de reconquista. Estiveram presentes Sinésio Campos (PT), Carlinhos Bessa (PV) e Yann Evanovick (PCdoB).
Apesar do movimento, analista político avalia que o desafio da esquerda no Amazonas é bem maior do que reverter números eleitorais: envolve recuperar espaço social, romper alianças tradicionais e formar novas lideranças, algo que não vem sendo feito há anos.
Virada e ascensão conservadora
Entre os anos de 2002 e 2014, Manaus e Humaitá foram essenciais para eleger e reeleger Lula e Dilma. Mas, a partir de 2018, tornaram-se áreas hostis à esquerda.
O caso de Humaitá mostrou essa mudança ao apoiar Fernando Haddad (PT) no primeiro turno de 2018 com 51% dos votos, e escolher Jair Bolsonaro no segundo turno com 55% dos votos, um candidato que naquele ano não tinha base no Amazonas.
Na capital não foi diferente, Bolsonaro venceu Haddad nos dois turnos de 2018, mesmo sem apresentar propostas concretas para o estado.
Em 2022, apesar de não ter realizado obras significativas e de ter ameaçado reiteradas vezes a Zona Franca de Manaus, Bolsonaro voltou a vencer nos dois municípios. A derrota da esquerda se ampliou para todas as esferas: presidente, senador, deputado federal e estadual.
“A esquerda encolheu no Norte e não criou novas lideranças”, diz cientista político
Em entrevista exclusiva do Portal AM1 com o cientista político, sociólogo e advogado Carlos Santiago, a crise da esquerda no Amazonas é profunda, estrutural e acumulada ao longo de anos sem renovação política.
Segundo ele, o enfraquecimento começou após o impeachment de Dilma Rousseff e se agravou pela falta de ousadia dos partidos no estado.
“A esquerda tradicional brasileira, que envolve o PSB, o PT, o PCdoB, encolheu em toda a região Norte. E, principalmente após o impeachment da presidente Dilma, não se criaram novas lideranças”.
Santiago explica que a ascensão conservadora encontrou terreno fértil justamente porque a esquerda amazonense havia perdido presença territorial e autonomia política.
“O principal partido de esquerda, o PT, é muito nanico no Amazonas. Nas últimas décadas, deixou de ousar criar novas lideranças para apoiar caciques locais como Eduardo Braga e Omar Aziz”.
Para ele, a dependência histórica das alianças com grupos tradicionais enfraqueceu o PT e as demais siglas da esquerda. E que nas últimas décadas, o partido tem deixado de ter mais ousadia em criar novas lideranças políticas para apoiar políticos tradicionais.
O cientista político afirma ainda que a situação é tão crítica que não há perspectiva de mudança no curto prazo.
“A curto prazo, não haverá mudança, porque os partidos de esquerda continuam distantes da sociedade, sem uma proposta firme para o Amazonas, para Humaitá e para Manaus”.
Derrota eleitoral repetida e sem explicação interna
Assim como outros analistas, Santiago avalia que a derrota de 2022 não ocorreu apenas por causa da onda bolsonarista, mas também pela estrutura defasada da esquerda no estado:
“Na eleição de 2022, houve um grande fracasso eleitoral no Amazonas. Os partidos de esquerda estão há décadas atrelados a caciques locais, deixando de promover ousadias e de apostar em novas lideranças”.
Ele reforça que, mesmo quando Lula vence em municípios do interior, isso não significa força partidária.
“Quando Lula vence no interior, é muito mais um voto nele, na figura dele, do que na militância ou na ação dos partidos de esquerda no Amazonas”.
Reconquista depende mais de Lula do que dos partidos locais
Para o especialista, não há perspectiva de mudança no curto prazo para a esquerda no Amazonas. Segundo ele, as siglas continuam distantes da sociedade, sem apresentar propostas consistentes para Manaus, Humaitá ou para o estado como um todo.
Além disso, afirma que muitos desses partidos estão ocupando cargos no governo estadual ou em outras estruturas de poder, o que, na prática, limita sua atuação social e sua disposição real de disputar poder político.
Santiago ressalta que, mesmo que Lula volte a vencer em municípios como Manaus e Humaitá nas próximas eleições gerais, o eventual desempenho será fruto da força pessoal do presidente, e não do trabalho dos partidos de esquerda no estado.
“Se Lula ganhar em Manaus ou Humaitá, será muito mais pelas suas ações no âmbito federal do que pela força dos partidários da esquerda no Amazonas”, concluiu Carlos Santiago.
Ele lembra que o mesmo ocorreu em 2022, quando Lula venceu em diversas cidades do interior apesar de a esquerda praticamente não ter presença política, articulação ou lideranças locais.
Para ele, esses votos expressam mais a confiança no presidente do que numa militância ativa ou numa estrutura partidária consolidada no Amazonas.
Não está claro como a esquerda pretende dialogar com o novo perfil do eleitor amazonense, quais lideranças serão responsáveis pela articulação e se haverá esforço de autocrítica para compreender a perda de influência.
*FONTE: AMAZONAS1
